Ainda era no início da viagem, mas eles — um casal — entraram no ônibus carregando um sanduíche. Permaneci seguindo aquela história até o momento em que escolheram a poltrona. Sentaram juntos, claro. A primeira coisa que fizeram foi abrir a embalagem. Quem estava com o lanche em mãos ofereceu, mesmo antes de dar sua primeira mordida.
Com um grande apetite, o primeiro pedaço
certamente contribuiu para saciar aquela fominha de fim de expediente. O
segundo, agora para a dona do sanduíche, não foi menos apreciado. Os olhares
cumpliciados por segundos e trocados sem palavras testemunharam aquele sabor.
Parecia bom, imaginei. Para que palavras, quando os instantes têm sabor, não é
mesmo.
Permaneci, com curiosidade, observando
esse momento que se repetia, não só de degustação, mas também de afetos
invisíveis que entregavam um ao outro. Tudo seguia assim: em um vai e vem cheio
de melodia. Não havia recusa, em nenhum momento, de algum ingrediente. Todos os
sabores eram aceitos como se tivessem sido escolhidos em um cardápio. Ninguém
quis ficar com mais ou sacrificar-se com menos.
No compasso desse lanche, contavam o que
sentiam em suas expressões. O que tinham parecia ser suficiente para aquele
momento. Se a fome é de alegria em um encontro, então, um sanduíche dividido
pode ser o ideal.
Entre uma parada e outra, não tem como
deixar de observar as vidas que são vividas, além das nossas, dentro de um
ônibus. Algumas cansadas, outras agitadas. Às vezes, há uma gentileza ou
descuido, mas sempre há algo para ouvir ou observar, de alguém ou de nós
mesmos. Permeado por curvas e, às vezes, freadas bruscas, andar de ônibus pode
ser um mergulho nessas histórias. Mesmo que seja apenas a de um sanduíche.
Nesse espaço de leituras de vidas que não
são mostradas, mas vividas, há muito o que aprender. Sabe quando se pega uma
história aqui e outra lá? Percebemos como estamos encharcados por seus roteiros
também. Nessa viagem de ônibus, não olhei pela janela, como faço, para avistar
a rua onde tantos carros seguem os seus caminhos. Perdi algumas histórias, mas
ganhei essa.
Pão, alface, tomate, talvez queijo ou
patê, talvez algo mais calórico ou light, talvez integral ou orgânico. Talvez
com cebola, prefiro sem. Quando se divide o sanduíche, não temos preferência. É
bom lembrar. Talvez ciúmes, alegria ou sofrimento fizessem parte desse recheio
também.
Pode ser que dividir um sanduíche seja
uma maneira de oferecer sabor à vida das pessoas. Um pouco mais picante, ácido
ou com ingredientes que se complementam. Pode ser que, ao dividir um sanduíche,
aprendamos a dividir as nossas vidas, a nossa atenção, o nosso melhor ou pior.
Observe:
tem sempre alguém nos oferecendo um sanduíche e, enquanto dividimos, podemos
aprender a dar e receber pequenos afetos. Isso é amar também.
Autor: Rafael E. Fosaluza da silva
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